Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

terça-feira, 30 de outubro de 2012

José Dirceu: do "Abaixo a Ditadura" ao banco de réu da Democracia

 Maurício Figueiredo

Nos anos 60, o Brasil era um país extremamente pobre, com elevadissimo número de analfabetos, uma classe média insignificante em termos numéricos e uma elite altamente poderosa em termos financeiros, beneficiada pela grande concentração de renda somada a uma série de privilégios que contribuiam para o aumento constante dessa riqueza.
 
Da mesma forma que um Castro Alves, no passado, se indignou com o regime de escravidão era natural que muitos se indignassem nos anos 60 com o grande estado de miséria do povo brasileiro e entre esses, os estudantes, naturalmente, eram os mais revoltados com a situação existente. 
 
Em 1959, um grupo de barbudos chefiados por Fidel Castro e seu fiel escudeiro Che Guevara realizou a Revolução Cubana. Grande parte da juventude brasileira passou a sonhar também com uma Revolução Brasileira. Praticamente, ela surgiu anos depois, mas não como a revolução sonhada, mas no melhor estilo de um golpe militar, mas cujos idealizadores fizeram questão de chamar de Revolução Gloriosa, antepondo-se a Revolução de 30, que historicamente passou a ser assim intitulada por ter mexido com as estruturas políticas e econômicas em vigor.
 
Já o Movimento Militar de 1964 não teve essas característica. Pelo contrário, para muitos serviu para impedir as reformas que vinham, timidamente, sendo colocadas em prática pelo governo João Goulart. A gota d'água da queda de Jango foi um Comício realizado na Central do Brasil, no dia 13 de março de 1964, quando o então presidente pisou um pouco mais no acelerador adotando medidas como a da encampação de empresas petrolíferas estrangeiras.
 
Mais ou menos dois anos depois de o movimento militar ter se estabelecido, dois rapazes da PUC de São Paulo trocavam ideia sobre a situação política brasileira. Luiz Travassos não titubeou: "Dirceu, vamos para Cuba? Isso aqui está insuportável. A gente pega um ônibus, sai do Brasil pedindo ajuda, consegue dinheiro com os estudantes". E completou a proposta com "Vamos conhecer o Che Guevara".
 
Por ironia do destino, o estudante que sonhava com um Brasil diferente, 48 anos depois, do golpe militar, é a figura central de um dos mais importantes julgamentos da História Republicana, acusado de corrupção, no episódio que passou a ser denominado de Mensalão. Justamente Zé Dirceu que, no primeiro governo Lula, como Chefe da Casa Civil, tinha status de Primeiro Ministro e orgulhava-se do seu partido (PT), alegando ser a agremiação que "não rouba e não deixa roubar".
 
Durante o golpe militar, com o endurecimento do regime, José Dirceu, juntamente com Vladimir Palmeira e Luiz Travassos, era um dos principais líder do Movimento Estudantil. Eles foram presos logo após a União Nacional dos Estudantes (UNE) ter realizado Congresso clandestino em Ibiúna São Paulo, mas em setembro de 1969, junto com outros, foram libertados na troca feita entre as organizações armadas de resistência à ditadura com o embaixador norte-americano que havia sido sequestrado, gerando um grande incidente e revés para os militares no poder. Junto com mais 12 presos políticos foram enviados para Cuba. Nesse dia, Dirceu disse ter ironizado o fato com Travassos: "Veja só demorou mas afinal estamos indo para Cuba. Não é bem como a gente imaginava, mas..."
 
Dirceu também conta um diálogo, que segundo ele, ocorreu na hora do embarque:
__ Quando o cara do Dops me pôs no avião naquela tarde de setembro, eu prometi: "Vou voltar, hein! Ele respondeu: "E eu vou te matar". Devolvi: "Vamos ver quem vai morrer primeiro". Ele era um baixinho meio careca, usava uma gravata solta, toda aberta, e nessa hora ainda gozou: "Vocês estão indo embora, conseguiram escapar." E eu respondi: "Mas vamos voltar, eu não estou indo embora, não estou escapando de nada. Pode tomar nota que vou voltar..."
 
Em seu livro "Abaixo a Ditadura - O Movimento de 68 contado por seus líderes", em parceria com Vladimir Palmeira, da Editora Garamond, Dirceu descreve sua capacidade de liderança, alegando que: "Muitas vezes fiquei pensando sobre onde aprendi a comandar, como surgiu em mim essa capacidade que até hoje muitas vezes me surpreende. No tempo do movimento estudantil e depois, na prisão, eu relacionava isso com a minha preocupação de trabalhar mentalmente, analisar as situações, tomar uma decisão e no mesmo instante aplicá-la. Continuo sendo assim. Uma das minhas principais características sempre foi, e ainda é, resolver as coisas e executá-las imediatamente".
 
E ainda: "Foi graças a isto que, muitos anos depois, tive iniciativas políticas que considero importantes: dei início junto com o Suplicy à CPI do Collor, desempenhei um papel de destaque contra o Quércia em São Paulo e ajudei a organizar a campanha das diretas. Aliás, foi na executiva estadual do PT de São Paulo que surgiu a palavra de ordem das diretas, muito antes da campanha, num encontro do partido em junho de 83. Lembro que na época nós dizíamos que era preciso unificar as lutas que tinham um aspecto institucional e a chamada esquerda do PT odiava isso, achava "direitismo". Mas impusemos nosso ponto de vista, conseguimos estendê-lo a todos os setores da oposição e depois incendiar os corações de norte a sul do Brasil. O povo queria eleger seu presidente; isso iria tranquilizar a sociedade e restabelecer a normalidade constitucional. Estas ideias simples desembocaram na campanha pelas diretas que encheu o país de esperanças."
 
Com a volta da normalidade democrática, José Dirceu foi um dos 111 que assinaram a ata exigida para a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), mas alega que inicialmente preferiu trabalhar na construção do partido, não se candidatando a cargo eletivo. Somente em 1986 é que acabou sendo eleito deputado estadual em São Paulo e em 1990 foi eleito deputado federal.
 
Por ironia do destino, em 1995, José Dirceu estava completamente afastado da estrutura do PT, tendo montado um escritório de advocacia. Seu trabalho político, no entanto, era o de coordenar um programa no Comitê da Cidadania - um projeto contra a corrupção. Foi daí que afirma ter levado um susto, quando foi convidado pelo Lula para ser presidente do PT, convite que já havia declinado em 1993. "Mas dessa vez concordei e acabei me tornando aquilo que realmente queria, presidente do PT".
 
Foi justamente essa volta à política partidária que levou o menino asmático (como o ídolo Guevara) de um dos maiores líderes estudantis do Brasil ao banco de réus no julgamento histórico pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que passou a ser conhecido como Mensalão, apontado como o "Poderoso Chefão" do esquema de corrupção.
 
O jovem que lutou contra a Ditadura acaba no banco dos réus da Democracia que ajudou a construir.
 
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"Toda a agitação que dominou o centro
da cidade na tarde de ontem começou pouco
depois do meio-dia, na esquina das ruas México
e Santa Luzia, fundos da embaixada americana,
quando dois soldados da PM que guardavam
a entrada lateral da embaixada, acompanhados
de agentes do DOPS e da Polícia Federal à
paisana, abriram fogo contra os estudantes, que
já haviam feito sua concentração no pátio do MEC
e caminhavam pela Rua Santa Luzia, em direção
ao restaurante do Calabouço.
Uma moça morreu e outras duas saíram feridas a
bala: Márcia Jurkiewics, aluna da Faculdade de
Estatística, ferida no tornozelo esquerdo quando
tentava refugiar-se em um estabelecimento bancário,
(...) e Jeni de Barros Lopes, com um tiro na coxa
direita. (...) Maria Ângela Ribeiro, atingida por um
tiro calibre 22 na fronte, foi levada com vida ao QG
da PM, onde não recebeu socorros médicos, morrendo
em seguida. Até esta madrugada desconhecia-se o
destino de seu cadáver."
 
Correio da Manhã, 22 de junho de 1968
 

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A tentativa de volta do Imperador


Adriano está se esforçando em sua volta ao Flamengo da difícil retomada de sua carreira esportiva. O enfoque  dado ao jogador é o correto. Mais do que sessões de terapia, clínicas de recuperação, aconselhamentos e tudo o mais - que sem dúvida são importantes - é na própria atividade do jogador que está a possibilidade de sua recuperação. O trabalho, nesses casos de problemas de ordem emocional, é sem dúvida o melhor remédio.

Tivemos no passado o triste caso de Mané Garrincha, destruído pelo vício do alcool, apesar do apoio de amigos, especialmente Nilton Santos e de sua companheira a cantora Elza Soares. O grande ídolo do futebol brasileiro ao lado de Pelé ao deixar os gramados não encontrou sentido   levar a sua vida adiante. Sem a escolaridade necessária e conhecimentos que o pudessem dentro do meio esportivo fazer com que desse continuidade a carreira, Garrincha se rendeu à bebida. Já Adriano é um atleta que, se dedicar ao futebol - e não precisa ser muita dedicação, tendo em vista o baixo nível atual - poderá voltar a vitrine.

Muitos, apressadamente, determinam que Adriano deva descalçar a chuteira. A hora de alguém parar profissionalmente deve ser algo de natureza íntima. Agora mesmo vemos juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) deixando o cargo por terem completado 70 anos e estarem no apogeu de suas carreiras, podendo contribuir muito para o país. Em outros países, o cargo chega a ser vitalício, em virtude disso.

O Flamengo e a presidente Patrícia Amorim, com sua sensibilidade feminina, poderia intervir nisso, deve dar a Adrino um tratamento diferenciado. Certamente, ele mesmo fora de forma não perderia muitos gols que atacantes rubronegros, regiamente pagos, têm perdido debaixo do gol. Mesmo o título de campeão brasileiro ostentado pelo Corinthians, se deve muito a um gol marcado por Adriano no auge dos seus 110 kilos.

Um jogador como o Imperador, que detém um contrato de risco, não pode ser colocado na rigidez do horário, como um simples atleta proveniente do time de juniores. Deve ser mostrado a ele, que quanto mais treinar, maiores serão suas possibilidades de recuperação, voltando mais próximo de uma boa forma. Faltar ao treino ou chegar atrasado só serve de material farto para a mídia,  mas nada contribuindo de positivo para o clube e para o próprio atleta.

Adriano é jogador pelo seu passado e pelo seu possível presente que faz parte da estirpe definida pelo deputado Romário Farias, com o seu célebre "treinar pra quê?" , nada mais do que a atualização da máxima do  Mestre Didi: "treino é treino jogo é jogo".

O jornalista João Saldanha definiu que um time de futebol não é feito de "anjinhos". Em época do politicamente correto, o jogador de futebol - proveniente de classes pobres - tem a vida vasculhada por vários setores, sempre em busca de escândalos. Até torcedores se sentem no direito de cercar jogadores em suas residências ou no local de trabalho para cobrar desempenho profissional e isso é visto, por alguns, com grande naturalidade.

É como se de repente, pacientes cercassem a equipe médica de um hospital exigindo "milagres", mesmo com a falta de equipamentos e material médico adequado, além de pessoal qualificado. Ou os pais na saída da escola fossem cobrar dos professores pelo mau rendimento dos filhos nas provas ou reprovação no ENEM.
Isso não ocorre nem com a nossa classe política.

É hora de deixar o Imperador em paz. E no momento, o futebol é a sua tábua de salvação.
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